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Quarta, 17 de Maio 2023

Artigo – Alienação fiduciária em massa e a cindibilidade – por Ezequiel Frandoloso

A busca nos cartórios envolvidos é altamente recomendável, tendo em vista as interpretações dissonantes quanto ao aceite da cindibilidade de garantia.

A alienação fiduciária é “o negócio pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel”, assim como dispõe o art. 22 da lei 9.514/97.

No caso de inadimplência do contrato, o credor pode executar a garantia no próprio cartório de imóveis e tomar posse direta do bem, mesmo que a dívida não seja equivalente ao valor do imóvel.

Inicialmente, essa lei só se aplicava às entidades autorizadas a funcionar no Sistema Financeiro Imobiliário (SFI) brasileiro, e as empresas de outros setores contavam com a hipoteca como garantia. No entanto, com a alteração da lei em 2001, o uso do instrumento fiduciário de alienação tornou-se disponível para qualquer contrato, resultando no aumento de sua utilização.

A alienação fiduciária é uma opção atraente para os investidores devido à sua maior segurança, menores custos de transação e possibilidade célere de execução da garantia diretamente no cartório de imóveis, sem intervenção judicial. Além disso, a propriedade é transferida para o credor, e o devedor perde a posse indireta da propriedade.

É importante observar que o contrato de alienação fiduciária pode ser constituído por documento particular. O uso do instrumento particular não é restrito aos sistemas financeiros, porém é importante fazer uma busca nos cartórios de imóveis a fim de apurar qual instrumento será aceito para registro, em razão de posicionamentos antagônicos. Lembrando que validade e eficácia da garantia só sejam garantidas por meio de seu regular registro do contrato no cartório de registro de imóveis.

No estado de Minas Gerais, por exemplo, a maioria dos cartórios de registro de imóveis exige a escritura pública como título de constituição da alienação fiduciária, com fundamento no Provimento Conjunto que institui o Código de Normas da Corregedoria Geral de Justiça do Estado, quando a alienação fiduciária não envolve o sistema financeiro. Entretanto, entendemos que a normativa claramente contraria o princípio da hierarquia das normas, visto que o próprio Código Civil em seu art. 108 contempla a possibilidade de flexibilização da exigência da escritura dispondo lei em sentido contrário, vindo justamente a lei de alienação fiduciária chancelar a validade do instrumento particular com efeitos de escritura pública em seu art. 38, portanto, é cabível suscitação de dúvida junto aos cartórios resistentes neste sentido.

Nos demais estados, como Goiás, Mato Grosso, Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina, entre outros, os cartórios de imóveis aceitam sem entraves o uso do mesmo instrumento aplicável aos contratos do sistema financeiro (instrumento particular).

Então, na relação comercial que não envolva o sistema financeiro, as Partes podem fazer a alienação fiduciária por instrumento particular ou por escritura pública. A preferência, por conta da celeridade e do baixo custo, é pelo instrumento particular.

Enfrentada a problemática quanto ao tipo de instrumento contratual aceito nos diversos cartórios de imóveis dos estados federativos, a questão que levantamos é a garantia em massa.

A alienação fiduciária em massa é a operação garantia por diversos imóveis. A lei 9.514/97 não impõe restrição quanto a garantir um contrato de alienação com vários imóveis – nem mesmo de diferentes cartórios -, o que, portanto, por não ser proibido é permitido. De toda sorte, existem situações que podem ser barradas no registro, apesar de que a tendência deva ser a facilitação de entrada do título para registro.

Entretanto, as Partes precisam se preocupar em estabelecer cláusulas que observem todo o regramento das alienações fiduciárias e, no caso em debate, entender o modo de execução extrajudicial do contrato na hipótese de inadimplência.

Imaginemos a situação de um contrato garantido por diversos imóveis de uma mesma circunscrição territorial, aqueles registrados num mesmo cartório de imóveis. O contrato precisa ter informações complementares para possibilitar eventual constituição em mora do devedor. As Partes, por exemplo, têm de mencionar o valor da dívida que cada imóvel garante e o valor de avaliação de cada um deles para o caso de leilão extrajudicial. Podem, também, estabelecer um valor único aos imóveis, desde que deixem claro no contrato que será leilão único para todos.

E se os imóveis dados em garantia são de diferentes cartórios? Podem as Partes entabular uma alienação fiduciária com imóveis de diferentes circunscrições imobiliárias? Como será feita, no caso, a execução extrajudicial em caso de inadimplência?

Todos esses pontos devem ser analisados na fase pré-contratual. Na situação, a alienação fiduciária deverá ser registrada em todos os cartórios, logicamente e, o instrumento deve detalhar os passos da execução, as fases, as averbações. Os cartórios analisarão todas as cláusulas e havendo entendimento de insuficiência ou que algo possa ser inexecutável, retornará com exigências, de modo que, para evitar a morosidade, o instrumento precisa ser claro quanto às fases da execução.

Isso significa que, se a dívida for divisível e houver a indicação expressa de quanto cada imóvel garante, o credor poderá executar a garantia em cada um dos cartórios de imóveis de forma separada. Por exemplo, se houver três imóveis dados em garantia e cada um garantir um terço da dívida total, o credor poderá executar a garantia em cada um dos cartórios com base no terço correspondente a cada imóvel.

Por outro lado, se a dívida for indivisível, o credor terá que executá-la em todos os cartórios ao mesmo tempo, apresentando o valor global da dívida em cada um deles. Nesse caso, se um cartório receber o valor da dívida e repassá-lo ao credor, ele deverá comunicar os demais cartórios sobre o cancelamento do procedimento. É importante ressaltar que o cartório de registro de imóveis não pode se recusar a receber o pagamento direto do devedor, mesmo que a regra seja o pagamento ao credor.

A questão da cindibilidade da garantia ainda gera controvérsia no meio jurídico. Nesse sentido, a par da corrente que é contra a cindibilidade da garantia, caso as Partes tenham intenção, desde a fase pré-contratual, de executar eventualmente apenas um dos imóveis em eventual inadimplemento pontual, a sugestão é de uma alienação para cada garantia nos locais em que não seja aceita a cindibilidade a fim de evitar transtornos no registro do instrumento e em eventual execução.

É importante que as partes especifiquem claramente o valor da dívida e qual parte dela é garantida por cada imóvel do negócio, a fim de evitar qualquer ambiguidade ou contestação futura, além de esmiuçar o procedimento de execução extrajudicial.

Por fim, a busca nos cartórios envolvidos é altamente recomendável, tendo em vista as interpretações dissonantes quanto ao aceite da cindibilidade de garantia. Isso evitará transtornos e morosidade na conclusão do próprio negócio e, especialmente, quando de eventual necessidade de execução extrajudicial do contrato.

Ezequiel Frandoloso é advogado, especialista em Direito Civil, Direito do Consumidor e Direito Imobiliário de Frandoloso Sociedade de Advogados. http://lattes.cnpq.br/6086279427143078

Sofia Costa é advogada em São Paulo, especialista em Direito Civil, Direito Imobiliário e Compliance, possui expertise em contratos e garantias no segmento da Indústria do Petróleo e Gás.

Fonte: Migalhas

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